O ano de 2023 é o primeiro em que a expressão “Dia do Índio” deixa de ser usada neste dia 19 de abril para dar lugar ao Dia dos Povos Indígenas. A alteração, prevista na Lei nº 14.402, de 8 de julho de 2022, está fundamentada na inadequação do termo “índio”, que reduz e desconsidera a diversidade indígena e reforça estereótipos. A mudança foi provocada pelo próprio movimento indígena. Para comemorar esse avanço e potencializar a luta em defesa dos povos indígenas, servidores dos campi do Instituto prepararam ações, eventos e projetos para todo o mês de abril.
Além disso, há no IFNMG profissionais que desenvolvem projetos de Extensão e pesquisadores que estudam sobre os povos originários. A professora Renata Ferreira de Oliveira, do IFNMG-Campus Salinas, é uma das estudiosas da história indígena e é autora do livro “Índios Paneleiros do Planalto da Conquista: do massacre e quase extermínio aos dias atuais”. Ela explica o porquê da inadequação da palavra “índio”.
“Esse vocábulo uniformizou os milhares de povos que habitavam o território brasileiro. Trata-se de um termo que se refere a um processo de dominação, pois reduziu ou apagou as identidades, as sociodiversidades e humanidades dos povos originários. No Brasil, os indígenas foram denominados de ‘índio’, ‘negros da terra’, ‘gentios’, ‘bugres’. Cada uma dessas palavras expressava o racismo vigente desde o processo colonizador”, expõe Renata, doutoranda em História pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde desenvolve sua pesquisa também na área de história indígena, especificamente na região Jequitinhonha.
A doutoranda elucida que a expressão “povos indígenas” faz referência a indigenato ou originário, termos que correspondem a história do Brasil como uma grande terra indígena, vastamente habitada por sociedades originais, falantes de milhares de línguas, com sistemas culturais complexos. “Ou seja, o que hoje é Brasil, no passado era um território ocupado por povos originários. Reconhecer isso, significa reconhecer a diversidade dos povos originários”, destaca Renata.
Percurso da resistência indígena no IFNMG
Entre as atribuições do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão Afro-Brasileiros e Indígenas (NEABI) no IFNMG está a de contribuir para a produção de conhecimentos e divulgação da importância da cultura negra, afrodescendente e indígena na formação do povo brasileiro e suas repercussões nos âmbitos local, regional e nacional. Desde o ano de 2012, ações e projetos são realizados de maneira mais potente.
O professor Johnisson Xavier Silva, presidente do NEABI central, dá um exemplo e conta que em 2021 foi realizado um Abril Indígena mais abrangente com cursos de formação e mesas de discussões com participações de lideranças indígenas, como Célia Xakriabá, que hoje é deputada federal.
“Neste ano, para celebrar o mês da resistência indígena, os NEABIs dos campi estão realizando atividades setorizadas. Por exemplo, no Campus Pirapora foi realizado o primeiro Fórum Indígena com representantes dos povos xacriabás e maxakalis para discutir as histórias dos povos indígenas da região. Já o Campus Teófilo Otoni realizou nos mesas redonda com a temática ‘Território e territorialidades dos povos indígenas do Vale do Mucuri’”, informa Johnisson Xavier que reconhece os progressos, mas manifesta que, “de modo geral, o debate em torno da temática indígena, no IFNMG, ainda ocorre de modo tímido e precisa ter avanços significativos”.
Para potencializar esse debate, o docente destaca que, apesar de o Instituto ter adotado a política de cotas para ingressos dos povos indígenas, há outras ações que podem contribuir para que mais estudantes indígenas possam ingressar e se manter no IFNMG. “Os povos indígenas do Jequitinhonha, Vale do Mucuri e Norte de Minas têm reivindicado vestibulares específicos, aumento das bolsas permanência e a aplicação da Lei 11.645/08, que cria a obrigatoriedade da implementação da história e cultura dos povos indígenas nos currículos escolares”, pontua o presidente do NEABI.
Quanto ao Programa Bolsa Permanência (PBP), o Ministério da Educação, que mantém o programa, divulgou hoje (19/04) que garantirá reajuste do valor da bolsa. Neste mês, os estudantes assistidos pelo programa já receberam o valor reajustado. O benefício passou de R$ 900,00 para R$ 1.400,00. O PBP consiste em uma ação do Governo Federal de concessão de auxílio financeiro a estudantes matriculados em instituições federais de ensino superior em situação de vulnerabilidade socioeconômica e para estudantes indígenas e quilombolas.
No IFNMG, a estudante indígena Witaty Braz da Silva, de 22 anos, é atendida pelo Programa Bolsa Permanência. Ela está no 9º período de Engenharia Agrícola e Ambiental, no Campus Araçuaí, e pertence ao povo pankararu e pataxó. “Moramos na Aldeia Cinta Vermelha Jundiba, onde preservamos a cultura e tradições como danças, cantos, histórias e comidas típicas. Pelo fato de eu morar na aldeia e ter que me deslocar até o campus, a bolsa que recebo é importante para me manter no Instituto”, afirma a acadêmica Witaty.
O acesso das comunidades indígenas ao Instituto
De acordo com a Plataforma Nilo Peçanha (PNP), que apresenta dados de todos os Institutos que compõem a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, em 2022, apesar de terem sido ofertadas 1090 vagas pelo IFNMG para a comunidade indígena, ingressaram 49 estudantes que se declaram indígenas. No que se refere ao número de matrícula e à classificação racial a partir da declaração dos estudantes, o menor percentual se refere aos estudantes indígenas no IFNMG.
O baixo número de estudantes indígenas se destaca pela discrepância em relação ao quantitativo de famílias indígenas na área de abrangência do IFNMG. Segundo a Secretaria de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes), há no Norte de Minas, Noroeste de Minas, Jequitinhonha e Vale do Mucuri quase quatro mil famílias indígenas. O Cedefes é uma organização não governamental que tem o objetivo de promover a informação e formação cultural e pedagógica, documentar, arquivar, pesquisar e publicar temas do interesse do povo e dos movimentos sociais.
A professora Maria Flávia Pereira Barbosa, que está à frente da Diretoria de Assuntos Estudantis (DAE) do IFNMG especifica que o entorno regional do IFNMG conta com 23 comunidades indígenas e com aproximadamente 10 etnias distintas. Entre elas, as etnias aranã, caboclo, guajajara, maxakali, kramun e xacriabá. Esta - presente na região de São João das Missões e Itacarambi - possui o maior número de famílias, são 2.897 famílias indígenas segundo a Cedefes.
Ciente de que o IFNMG não alcança, ainda, as 23 comunidades indígenas e suas quase quatro mil famílias, a diretora Maria Flávia é direta em sua palavras: “A gente ainda não alcança todas as comunidades indígenas da nossa área de abrangência, com o objetivo de trazê-los para dentro da nossa instituição. Mas estamos trabalhando e pensando em alternativas para esse ingresso acontecer de uma maneira mais equânime e justa”.
A diretora ainda destaca que considera o Programa Bolsa Permanência um dispositivo fundamental para manter aqueles alunos que conseguem acessar a política pública de educação que o Instituto oferece. Outros mecanismos estão sendo potencializados para aumentar a presença indígena nos campi a partir de três compromissos alicerçados no tripé Ensino, Pesquisa e Extensão.
“O IFNMG tem um compromisso de respeito profundo com os povos originários, tem um compromisso de atendimento em formato de Extensão e agora estamos trabalhando na tentativa de construir um compromisso na vertente do Ensino. Isso porque a presença das comunidades indígenas dentro da instituição transforma, não só do ponto de vista do convívio social, mas, especialmente, do aprendizado, uma vez que essas comunidades trazem conhecimento próprio e ancestral”, fundamenta a diretora.
Assessoria de Comunicação do Conif
Texto: Ascom IFNMG